O Delegado
que Virou Cangaceiro
Contemporâneo
dos Limões (1865/1879), Liberato Cavalcante de Carvalho Nóbrega foi o delegado
que virou cangaceiro. Com base em informações obtidas nos livros ¨Cônego
Bernardo¨ e ¨Cangaceiros do Nordeste¨, publicados no século XIX, pelo escritor
paraibano Pedro Batista, o memorialista Trajano Pires da Nóbrega em sua obra
genealógica¨A Família Nóbrega¨, editada em 1956, apresenta a história do jovem produtor rural Liberato Cavalcante de Carvalho Nóbrega que
foi nomeado delegado da Serra do Teixeira, no sertão paraibano, nos idos dos
anos60/70 do século XIX, e depois, por razões, igualmente políticas, seguiu a
trajetória do cangaço.
Cadeia Pública de Teixeira/PB |
O resgate da
história de Liberato foi possibilitado porque Trajano teve acesso a história
oral relatada por dona Francisca Rodrigues, viúva de Francisco Benigno, mais
conhecido como ¨Benigno Caluete¨, uma das vítimas do cangaço de Liberato. Dona
Francisca se casou, em segundas núpcias, com Francisco Vicente de Araújo,
habitante da cidade de Patos na Paraíba e amigo do escritor Trajano da Nóbrega.
Patos/PB - 1915 |
Segundo
relatos da tradição oral, Liberato era corpulento, calado, retraído, benquisto
e respeitado. Sua área de atuação se restringiu as circunvizinhanças da Serra
do Teixeira, com epicentros na própria Vila do Teixeira, em Patos e em Santa
Luzia, ambas no sertão paraibano.
Liberato,
descendente direto da tradicional família Nóbrega, era bem relacionado com
personalidades políticas de destaque na Paraíba, como o cônego Bernardo e o Dr.
Manuel Dantas. O cônego Bernardo Carvalho de Andrade era primo de Liberato, a
quem o considerava coirmão. Foi vigário do Teixeira, arcipreste (equivalente a
Bispo) e deputado provincial da Paraíba. Outra personalidade do conjunto de
relações sociais de Liberato era o Dr.
Manuel Dantas Correia de Góis, principal liderança da região. Era
padrinho de Augusto, irmão de Liberato. Depois de certa relutância por parte de
Liberato Nóbrega, Dr. Manuel Dantas o nomeou delegado do Teixeira, em comum
acordo com o cônego Bernardo, de quem era amigo e compadre.
O principal
objetivo da nomeação de Liberato como delegado era o enfrentamento aos
Guabirabas, bando formado por três irmãos: Cirino, Juvino e João, além de um
cunhado chamado Manoel Rodrigues. Segundo Trajano da Nóbrega, os Guabirabas
eram criminosos insolentes e perigosos, vindo de Pajeú de Flores, em
Pernambuco.
No dia 21 de abril de 1862, o bando dos
guabirabas saqueou a feira de Teixeira, promovendo roubos e todo tipo de depredação.
Atirando a esmo, em trotes agalopados pela rua da vila, emitiam provocações a
Liberato, que percebendo a superioridade numérica do bando, resolveu emboscá-lo
na descida da serra. Um tiro certeiro de clavinote pôs fim ao bandoleirismo de
Cirino Guabiraba. O trabalho de delegado de Liberato foi posto a prova, quando
prendeu um apaniguado do doutor Dantas, acusado de homicídio, recebeu a
recomendação para colocá-lo em liberdade, ao que Liberato respondeu em latim: ¨dura lex, sede lex¨(a lei é dura, mas é
lei), fato que desagradou profundamente, o doutor Dantas. Sabendo que teria um
revide do chefe político, a partir desse momento, Liberato passou a ser apenas
¨o cabra da serra¨. Não foi só noções de latim que Liberato herdou dos
religiosos que o protegiam. Suas ações
eram anunciadas com o soar de um sino. Quando tentou reassumir o posto, foi
preso e recolhido ao cárcere pelo novo delegado, sob acusação de autoria de homicídios,
dentre eles o de Cirino Guabiraba. O seu irmão Augusto passou a liderar o bando
e tentou resgatá-lo, mas já era tarde. Uma tropa especialmente designada, para
tal fim, recambiou Liberato para a cadeia pública de Parahyba, capital da
província, aonde veio a falecer, depois de contrair varíola, durante a epidemia
do final do século XIX.
Cadeia Pública de Parahyba |
Em versos, o
menestrel cordelista Leandro Gomes de Barros (1865/1918),nascido no Sítio Melancia,
no município de Pombal, na Paraíba, que morou no Teixeira, registra a saga do
bravo Liberato Nóbrega com os facínoras Guabirabas, o poema de Gomes de Barros
está editado no livro Ao Som da Viola,
de Gustavo Barroso, publicado em 1921. Em sextilhas rigorosamente metrificadas,
o poeta Ariano Suassuna (1927/2014) enaltece as ações dos irmãos guabirabas e o
delegado-cangaceiro Liberato Nóbrega é mero figurante, em seu livro de poesias
Os Guabirabas, publicado em 1943. Os Limões, arqui-inimigos dos Brilhantes, não
fazem parte da memória suassuniana o seu magno Romance d’A Pedra do Reino e o
Príncipe do sangue do vai-e-volta (1971) é dedicado à memória de seu pai João Suassuna
(1886/1930) e Jesuíno Brilhante
(1844-79). No dia 14 de março de 2008, o poeta paraibano Gil Hollanda lançou em
Caicó, capital do Seridó potiguar, durante café poético, com a presença do poeta
Kydelmir Dantas, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC)
e do repentista Chico Mota (1924/2011) o folheto de cordel ¨O Delegado que
Virou Cangaceiro¨.
Livro de Gustavo Barroso |
Epitácio Andrade, Chico Mota, Kydelmir Dantas e Gil Holanda |
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