sexta-feira, 15 de junho de 2012

Cantofa e Jandi


Cantofa e Jandi
 Poema de Aucides Sales musicado por Dudé Viana
 
Ao povo peço licença à musa inspiração
Modo eu contar um drama vivido no meu sertão
Da índia que apunhalaram em riba do coração
Seu nome era Cantofa e tinha uma neta Jandi
Era uma menina fêmea, bonita como Araci
A estrela da manhã, tapuias do Apodi

Nas eras mil setecentos, o ano sessenta e um
Tiraram do Apodi os tapuios Paiacu
Para a Serra dos Dormentes foram todos transferidos
No dia doze de junho o rancho foi removido
Pedido dos curraleiros que se achavam irritados
Porque os índios tapuias viviam matando gado

O juiz Castelo Branco, na serra fundou a vila
Pôs nome de Portalegre, inda hoje é conhecida
Num sítio da serra haviam os índios Pegas morado
Lhes expulsaram os Paiacus, por dois brancos chefiados

Ali nasceu um sambudo que batizaram de João
Apelido João do Pega por ser daquele torrão
Os fazendeiros cercavam João e seus companheiros
Que viviam caçando gado criado no tabuleiro
Tapuios e brancos brigavam por este mesmo motivo
Pro índios gado era caça, pro branco bicho cativo

Em 1817, houve uma revolução
Morreu André d’Albuquerque, mataram a traição
Pra não entrar nessa briga os índios se retiraram
Aí roubaram suas terras os brancos que ali ficaram
Oito anos depois, e ainda havia confusão
O coronel Vieira Barros pôs fim na situação

Prisioneiro que fora, na cadeia da Bahia
Porque era patriota e igualdade queria
Mandou libertar os índios que estavam na cadeia
Que faziam confusão por ter perdido a aldeia
Mas os índios que foram soltos, mesmo assim se revoltaram
E açulados por Cantofa, certo dia atacaram

O chefe foi João do Pega, mataram o delegado
O coronel Barros se matou, foram os índios acorrentados
Setenta jovens tapuios para Natal eram escoltados
Porém foram em Viçosa pelos brancos fuzilados
Só escapou João do Pega, por arte de bruxaria
Fugiram 330 depois desta covardia

Mas Cantofa e Jandi ficaram ali escondidas
Cantofa por ser tão velha e Jandi pouco crescida
Um caçador viu no mato Jandi a colher caju
Correu ligeiro pra vila e armou-se o sururu
O povo veio pra matar quem os índios revoltara
Causando a morte de Barros, e o delegado matara

Mas o povo desvaneceu de acabar a pajé
Somente o caçador não se comoveu da fé
Cutuca o peito um punhal, daquela pobre curuca
Jandi lhe abraçou chorando, o povo abriu as butucas
Com os olhos cor de pitanga, voltaram todos pra vila
Deixaram Jandi chorando, Cantofa ali estendida

Esta cena comovente deixou todos comovidos
João do Pega, um caçador, achou no mato escondido
O governo o perdoou depois daquele ocorrido
O povo lhe venerou e viveu bem assistido
Num lugar chamado Bica
De Cantofa e Jandi, veja um mistério que fica
Morreu Cantofa na bica, Jandi desapareceu
E ficou mal assombrado, no canto que ela morreu.
 * Romance de cordel do poeta Aucides Bezerra de Sales sobre os índios tapuias na região da chapada do Apodi e da Serra de Portalegre, no oeste potiguar, nos idos 1700, que foi adaptado musicalmente pelo cantor, compositor e escritor Dudé Viana e recebe o incentivo cultural deste sítio cibernético e deste agitador.
O poeta, o músico e o agitador cultural

domingo, 10 de junho de 2012

Cordel

Gilberto Cardoso dos Santos - "Poeta da Amizade"
Gilberto mostra cordel sobre poeta conterrâneo
                                      Nascido em 07 de outubro de 1964, o cordelista Gilberto Cardoso dos Santos é conterrâneo paraibano-cuiteense do poeta Dinamérico Soares, para quem publicou um cordel que o chama de "filho da poesia".
Capa do cordel alusivo a Santa Rita

                                          Desde adolescência, radicado em Santa Cruz, no agreste potiguar, terra da maior estátua católica do mundo, Gilberto Cardoso é um sujeito fomentador das amizades e renovador da fraternidade, características de caráter que contribuíram para lhe inspirar na elaboração do folheto de cordel "A Saga de Santa Rita - Da Itália a Santa Cruz".
Os Segredos da Amizade
                                  Formado em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e especializado em Língua Portuguesa, "O Poeta da Amizade" formulou um cordel sobre os segredos da amizade, que preceitua os princípios filosóficos que dão sustentação a mais necessária das relações humanas para a manutenção da saúde mental.
Sobre Jesus Cristo

                                      Sobre sua amizade com Jesus Cristo, recitou "O Homem que Mudou a História".
Cordel sobre Mons. Raimundo
                                      A rotina do artista é uma tessitura entre a construção das amizades e a formulação poética, dessa maneira produz seus poemas sobre personagens do quotidiano. Para o sacerdote Monsenhor Raimundo, recitou o acróstico: "Padre cheio de carinho/Amigo em horas cruéis/Dedicado sacerdote/Restaurador dos Fiéis/Ensinador de verdades". "Repulsa tinha aos lauréis/A vida que escolheu/Impôs-lhe duros papéis/Mas ele prosseguiu firme/Unindo até infiéis/Na busca de algo novo/Deixando para seu povo/O exemplo de Moisés".
Seu Quinado
                                   O poeta da amizade vai ao encontro do povo e, com maestria, recita a gente simples do sertão nordestino. Pode-se constatar tal assertiva, no folhetos de cordel "A Morte de Seu Quinado" e "Meu Encontro com o Xexéu".
Sobre o cordelista Xexéu
                        Viaja do popular ao erudito, sem dificuldades. No campo da cultura popular, realizou importantes resgates históricos que estão consubstanciados nos folhetos: "Loucuras de Zé Limeira - O Poeta do Absurdo" e "A Cunfissão dos Caboco Zé da Luz e de Luzia".
Resgate do poeta Zé Limeira
Sobre poeta Zé da Luz e declamador Zé de Luzia
                     No campo mais próximo do erudito, recitou em versos "Vida de Roberto Carlos", o rei que quer "ter um milhão de amigos" e a bela poesia "A Incrível História de Ben Carson", que termina com o acróstico: "Graças a mães desse porte/Incríveis coisas se dão/Levantam-se grandes homens/Bons em qualquer profissão/Elas fazem diferença/Remam contra a provação/Tempos depois aparece/O fruto de sua ação".
Sobre Roberto Carlos
Sobre Ben Carson
                    De volta ao popular, o poeta discorre em "A Incrível História de Dick", um pouco de sua amizade com os animais, e em "Messias, o Rei do Nó, e a Mágica Desastrada", fala sobre sua amizade com figuras folclóricas.
Amizade com os animais
Amizade com figuras folclóricas
                       Para seu amigo Hugo Tavares Dutra, uma das principais lideranças do movimento pela radiodifusão comunitária, Gilberto Cardoso publicou o folheto de cordel "Um Brasileiro Insistente".
Sobre Hugo Tavares
                     Seu amigo-irmão o cantor e compositor Hélio Crisanto foi presenteado com uma biografia em versos.
Sobre Hélio Crisanto
                   No dia 29 de agosto de 2011, durante o lançamento do livro "A Saga dos Limões - Negritude no Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno Brilhante", em Natal, capital do Rio Grande do Norte, Gilberto Cardoso dos Santos, "O Poeta da Amizade", ofereceu ao autor, seu amigo Epitácio de Andrade Filho, o folheto de cordel: "O Doutor e o Cangaceiro - A Saga de Doutor Epitácio Andrade com Jesuíno Brilhante e a Família Limão".
Capa de "O Doutor e o Cangaceiro"





Sustentabilidade

Algodão Colorido
                        Há cerca de 4500 anos, os incas e os astecas no continente americano já conheciam o algodão colorido. Na Ásia, na África e na Austrália, em períodos que antecederam a era cristã, também se encontram registros do desenvolvimento da planta silvestre. Foram encontradas 39 espécies de algodões com fibras coloridas verde, amarela, azul, cinza e, principalmente, marron.
Cultivo do algodão colorido
                                    Com o desenvolvimento da consciência planetária, em torno da sustentabilidade para garantir a vida das gerações futuras, nas últimas décadas do século XX, a humanidade começou a despertar um novo interesse pelo algodão colorido, por tornar desnecessário o uso de corantes no tingimento dos tecidos, evitando a contaminação dos recursos hídricos pelos rejeitos químicos.
Campina Grande/PB
                                    A cidade de Campina Grande, capital da Borborema paraibana e segundo maior cidade do interior nordestino, que teve seu crescimento econômico-social vinculado ao ciclo do algodão, voltou a ser considerada a "Liverpool Brasileira", tornando-se importante polo científico-tecnológico, com o desenvolvimento de pesquisas pela EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias) e com o incremento da produção de tecidos e confecções, impactando no mercado internacional da moda.
Moda a partir do algodão colorido
                                Com a retomada do cultivo do algodão colorido em municípios como Patos, no sertão paraibano, e Touros, no litoral do Rio Grande do Norte, contribui-se para consolidar uma estratégia de sustentabilidade para o segmento do mercado mundial representado pelo vestuário.

NEGROS DO RIACHO


Escravos da Miséria

                     À margem da rodovia BR-226, a 06 km de Currais Novos, no Seridó Oriental do Rio Grande do Norte, um grande artefato de cerâmica, em forma de panela, sinaliza a entrada da mais pobre comunidade remanescente de quilombos do estado: o Sítio Bom Sucesso, conhecido como “Negros do Riacho”.
Artefato na entrada da comunidade


                                 Da entrada até a comunidade rural distam ainda 06 km em estrada carroçável, que são percorridos, diariamente, pelos comunitários a pé, em lombo de animais, em carroças, de carona em motos ou veículos, em direção a cidade onde buscam acesso aos benefícios das políticas públicas e praticam a mendicância.
Comunidade Negros do Riacho
 
                              Isolados numa ilha de miséria de 03 hectares, cercados por ricos fazendeiros por todos os lados, os “negros do riacho”, ocuparam o território, fugindo do flagelo da escravidão, provavelmente na segunda metade do século XIX, conforme relata Laurentino Lopes da Silva, 94 anos, único filho vivo do patriarca José Trajano. “P.”, filha de Seu Laurentino, uma das lideranças da comunidade, informa a situação de pobreza em que se encontra seu povo, afirmando que “o programa do leite ainda distribui o produto, mas feira é só aqui e acolá”.
Visita domiciliar
 
                    Simpática e agradável, P. recebeu a equipe multiprofissional para falar sobre os principais problemas de saúde dos comunitários. Como o psiquiatra sanitarista Epitácio Andrade, afirmava que as doenças infectoparasitárias e o alcoolismo são mais prevalentes nas situações de pobreza, P. com sua ingenuidade perspicaz, perguntou-lhe se “era médium”. O médico sorrindo, percebeu que por trás da pergunta estavam sentimentos de vergonha e timidez, que a impediam de expressar sua verdadeira crença religiosa de matriz africana, desestimulada e “invisível” na negritude do riacho.
                                 A equipe identificou casos de alcoolismo, mas não evidenciou comportamentos violentos. Por outro lado, ficou explícita a ociosidade a que está exposta a comunidade. Um comunitário, sob efeito de umas “choradeirinhas”, enquanto pedia “trocados”, divertia-se e aos visitantes colocando uma volumosa pedra de granito sobre sua cabeça. De início, a assistente social Candice Guedes ficou com medo que se pudesse atirar a pedra contra a equipe, até ouvir a interpretação do psiquiatra: “Esta pessoa é um ator em potencial, sua brincadeira é puro teatro”. Candice passou a fotografá-lo com tranquilidade e a mesma a posar com desembaraço. Depois pareceu fácil entender que aquelas atitudes infantilizadas, produzidas pela ociosidade dominante na coletividade, poderão ser superadas com oficinas culturais.
Campo de Futebol
                                O futebol, principal esporte nacional, que imortalizou o negro Edson Arantes do Nascimento, “Pelé”, como um dos maiores atletas mundiais de todos os tempos, não atenua o problema do alcoolismo na comunidade, nem se constitui em alternativa para melhorar a qualidade de vida dos comunitários, nem é uma opção de lazer, nem uma possibilidade de renda para os “negros do riacho”. Simplesmente é mais um estímulo ao alcoolismo, porque não é planejado como uma atividade educacional, nem encarado como prática desportiva pelo poder público. O descaso com o esporte está evidenciado no campo de “pelada” da comunidade: a estrada de acesso passa pelo meio do “estádio”.
Sede social está fechada

                            A organização social dos Negros do Riacho é extremamente frágil. A sede do Centro Comunitário foi construída em 1994, com ajuda de religiosos alemães, e restaurada pela Prefeitura de Currais Novos em 2005. Permanece fechada a maior parte do tempo, e, praticamente, não ocorrem reuniões. No ano seguinte à restauração, a Fundação Palmares reconheceu a comunidade como remanescente de quilombos.
                             As condições de vida da população quilombola são, por demais, precárias. Para “P.”, depois da morte de Dona Tereza, há cerca de quatro anos, acabou a produção de cerâmica. Dona Tereza foi uma líder comunitária e espiritual dos Negros do Riacho, e mantinha em funcionamento um centro de artesanato, que gerava alguma renda para as mulheres, principalmente. Nos dias de hoje, em agosto de 2011, o centro de produção artesanal está desativado.
Jovens no carteado na sede do centro de artesanato
                          O centro de artesanato foi entregue a comunidade sem reboco e sem piso de cimento. Durante a visita da equipe, foi possível constatar que os jovens comunitários permaneceram jogando baralho no alpendre do centro até a saída dos profissionais. A ociosidade é preenchida por práticas não-produtivas. Não foram identificadas práticas reflexivas, porém foram relatadas experiências sobre a formação de grupos de capoeira.
                          A ausência de atividades produtivas é determinante para a ociosidade. A agricultura de subsistência, praticamente, não existe, assim como inexiste horta comunitária. A educação para jovens e adultos está desativada. Resta para essa clientela o lazer do carteado.
                          Na comunidade não tem escola, nem creche. As crianças estudam numa escola de uma comunidade rural vizinha, porém passam a maior parte do tempo em casa, sob os cuidados das mães.
Visita domiciliar
                               A matrícula das crianças na escola parece ser uma das estratégias de sobrevivência das famílias, cuja intenção é auferir os benefícios das políticas compensatórias, tipo bolsa-escola. Não foram encontrados estudantes universitários na comunidade, que pudessem se beneficiar da política de quotas.
                                As condições sóciossanitárias da comunidade são extremamente deficitárias. Das 48 famílias que vivem no pequeno território quilombola, a maioria não dispõe de fogão a gás, nem de geladeira. Grande parte utiliza o fogão a lenha para cozinhar seus alimentos. A lenha é colhida nas proximidades das residências agravando a tendência desertificadora da região, com um atenuante, que é a extração da madeira da algaroba, árvore de adaptabilidade favorável no semi-árido nordestino.
Lenha de Algaroba
                      Não são desenvolvidas ações de educação ambiental, voltadas para a preservação do meio ambiente e/ou para a utilização racional dos poucos recursos naturais. Não há coleta de lixo, nem tão pouco, coleta seletiva. O lixo se acumula no entorno das residências, onde as crianças “brincam”, ou melhor, conseguem se divertir, na companhia dos animais domésticos.
Lixo peri-domiciliar
                          A maior parte das casas tem aparelho de televisão e antena parabólica, porém a audiência é voltada, basicamente, para as telenovelas e para o noticiário policial. O telejornalismo tem pouca audiência. Existem aparelhos de rádio que sintonizam as emissoras de radiodifusão AM de Currais Novos. Não existe radiodifusão comunitária. Não foi percebida a existência de computadores que pudessem permitir acesso as mídias sociais. O acesso a comunicação midiática não tem favorecido ao desenvolvimento da consciência crítica da comunidade, apesar de em 2006, ter recebido o reconhecimento de auto-afirmação quilombola pela Fundação Palmares.
                           Nas paredes das casas ainda existiam fotografias de candidatos que foram votados pelos comunitários, em resposta a ações assistencialistas praticadas como doação de gêneros de primeira necessidade, como alimentos, dinheiro, calçados, dentaduras, óculos, dentre outros, conforme relatos em conversas informais com a equipe. A comunidade faz elogios a alguns políticos, afirmando dever-lhes favores por benefícios recebidos.
Placa do auto-reconhecimento
                       A partir da data de auto-reconhecimento, foi intensificada a substituição dos casebres de taipa por casas de alvenaria, porém a qualidade dos materiais utilizados foi, no mínimo, duvidosa, uma vez que a maioria das residências apresenta rachaduras e infiltrações, com comprometimento da estrutura arquitetônica, sabendo-se que a área não apresenta histórico de sismicidade importante.
Habitação com rachadura
                      Por razões que não se conseguiu esclarecer, a maior parte das famílias do quilombola não está inserida nos critérios para pagamento da taxa mínima de eletrificação rural, chegando-se a pagar uma média de 40 a 80 reais/mês por família. Algumas residências estão sem fornecimento de energia elétrica e outras não têm ligação com a rede elétrica da companhia energética no estado.
Sem energia elétrica
                       A criação de caprinos é uma das poucas atividades de subsistência desenvolvida por algumas famílias da comunidade. É desenvolvida de forma extensiva, ocupando a área do entorno das residências, e envolve todos os membros da família.
Dessalinizador
                       A preciosidade da água no semi-árido não pareceria ser um problema para os “negros do riacho”, se não fosse “salobra”. Captada em poço artesiano, pela força eólica de um cata-vento, e impulsionada até uma caixa d’água de 20 mil litros, por uma bomba elétrica nos canos de uma adutora, a água para consumo chega às residências em latas d’águas conduzidas por mulheres em suas cabeças.
                       A salinidade da água é, parcialmente, tornada palatável, pela ação de um velho dessalinizador, sem manutenção, que fica ao lado da caixa d’água. Como as famílias não possuem filtros, a água consumida não é filtrada. Como utilizam fogão a lenha, dificilmente a água é fervida. A falta de tratamento da água para consumo humano favorece o surgimento de infestações parasitárias e de doenças infecciosas, como hepatite e gastroenterocolites.
                      A má utilização da água foi flagrada durante a visita multiprofissional, onde se constatou o desperdício d’água do reservatório principal, que fica transbordando constantemente, drenando o precioso líquido, para quem precisa menos: a caatinga.
Desperdício d'água
 
                       Os recursos hídricos disponíveis não são utilizados para o desenvolvimento de atividades produtivas. Não existe produção local de hortifrutigranjeiros. Um reservatório, tipo “tanque”, com capacidade para mais de 50 mil litros, idealizado para a piscicultura não funciona, permanecendo vazio e, portanto, sem peixes.
Tanque vazio

                     A sede comunitária dos Negros do Riacho, que permanece fechada a maior parte do tempo, fica vizinha ao sistema de abastecimento d’água (reservatório e dessalinizador). Teoricamente, facilitaria a gestão das águas para o consumo humano e para atividades produtivas, mas, praticamente, não há nenhum planejamento para a utilização dos recursos hídricos, visto que a água chega até as residências em latas d’águas nas cabeças femininas e não é distribuída para a produção econômica.
Sede social e caixa d'água
  
                              No pátio da sede comunitária, existe um piso de cimento, em formato circular, que já foi utilizado como “roda de capoeira”. Como não tem cobertura, e os comunitários não têm calçados apropriados, o escaldante sol do sertão impede a utilização deste precário espaço social. A inadequação dos espaços coletivos da comunidade é mais um motivo para justificar o deslocamento dos negros do riacho à zona urbana de Currais Novos, onde permanecem, em sua maioria, nas proximidades do mercado público, quase sempre, pedindo esmolas.
Espaço sem cobertura para capoeira
 
                            O fluxo constante dos comunitários à zona urbana expõe ao alcoolismo, a persistência do status de inferioridade e a violência urbana. Um jovem com 16 anos, há cerca de 10 meses, após ingesta excessiva de bebidas alcoólicas na cidade, ao regressar à comunidade foi atropelado na BR-226, e ainda hoje convalesce de uma fratura exposta na perna esquerda.
                   O patriarca Laurentino não estava na comunidade na ocasião da visita. A historiadora Maria do Socorro Fernandes Cruz, componente da equipe multiprofissional do ambulatório de saúde mental da Secretaria de Saúde de Currais Novos, juntamente com a técnica em enfermagem Amanda Cecília de Souza Araújo, percebendo as difíceis condições para ter o direito de envelhecer na comunidade, chegaram a aventar a possibilidade de o ancião estar no abrigo de idosos da cidade, mas essa hipótese foi descartada por familiares.
Equipe interdisciplinar em visita domiciliar
 
                         Depois da visita à comunidade, ficou claro: “Negros do Riacho” sempre foi uma peça publicitária dos governos. A realidade da comunidade é muito diferente. Há imensa demanda social nesta coletividade que vive abaixo da linha da pobreza. Para compreender a realidade é necessário parodiar o poeta: “A panela está cheia de ratos... As idéias sobre os negros do riacho não correspondem aos fatos”.

Currais Novos/RN, setembro de 2011.

* Breve diagnóstico situacional da Comunidade "Negros do Riacho", formulado por Epitácio de Andrade Filho (Médico Psiquiatra Sanitarista), Candice Guedes (Assistente Social), Maria do Socorro Fernandes Cruz (Historiadora) e Amanda Cecília de Souza Araújo (Técnica em Enfermagem). 


                                    

quarta-feira, 6 de junho de 2012

"Bulindo cum eu..."

Pipocão e Tutti-fruti
Uma Comédia Anti-bullying
                         O bullying é o conjunto de ações violentas de natureza física e/ou psicológica, intencionais e repetidas, praticadas por um individuo ou grupo contra uma pessoa numa relação de poder desigual, causando-lhe dor e angústia e se estabelecendo situações que podem ser caracterizadas como assédio escolar. Tem se tornado num dos principais problemas educacionais do país pela dificuldade das vítimas expressarem seu sofrimento, por impactar nos indicadores educacionais e de saúde escolar, por contribuir para manter uma cultura de impunidade e pela inexistência de instrumentos pedagógicos eficazes/eficientes de abordagem. Com o intuito de desenvolver um instrumental teórico-prático de enfrentamento ao problema representado pelo assédio de escolares na faixa etária de 07 a 14 anos, formulou-se um esquete cênico para os palhaços “Tutti-fruty” & “Pipocão”, com adaptação de textos circenses e polêmicas sobre alimentos industrializados e naturais, para que num espetáculo interativo com a platéia formada por escolares e professores, possa se realizar uma comédia anti-bullying.
Comédia anti-bullying

                                  “Bulindo cum eu...” é um espetáculo com duração aproximada de uma hora e os palhaços são incorporados por um arte-educador e por um artista circense, sendo registradas as observações comportamentais da platéia escolar, previamente conhecida por meio de contatos com a docência, por um médico psiquiatra e por um psicólogo. Após a realização de algumas apresentações do espetáculo cênico em diferentes cidades do Estado do Rio Grande do Norte, tem-se observado, preliminarmente, que a atividade socioterápica deixa as crianças “maravilhadas”, interativas e requisitantes de novas apresentações, ao mesmo tempo em que as professoras fazem relatos que os escolares desenvolvem o conhecimento sobre o problema do assédio escolar e melhoram no aspecto relacional com os colegas, impactando nos indicadores educacionais e de saúde escolar, inclusive com percepção da melhoria comportamental pelos genitores e familiares, constatando-se que a intervenção tem produzido efeitos de natureza cognitiva e afetiva com importantes repercussões volitivas.
Epitácio Andrade entre Tutti-fruti e Pipocão
 * Resumo de trabalho científico elaborado para avaliação da comissão examinadora da II Mostra Nacional de Práticas Psicológicas, prevista para o período de 20 a 22 de setembro de 2012, em São Paulo/SP.
**Autores: Alberi Silva - Artista circense (Palhaço Tutti-fruti), Alexandre Bosco da Silva Oliveira – Psicólogo, Aucides Bezerra de Sales – Arte-educador (Palhaço Pipocão), Epitácio de Andrade Filho – Médico psiquiatra e sanitarista e Tiara Ferreira e Andrade (Estudante de psicologia).

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Cacarajé

Chef Cacá e Epitácio Andrade



                    COZINHA BAIANA EM NATAL                          
                       Do vínculo com a religiosidade à comercialização industrial, os famosos bolinhos de feijão africanos ganharam corpo na Bahia e foram além de oferendas às divindades: hoje, os acarajés são integrantes oficiais da dieta alimentar de uma deusa do culto afro-brasileiro, da população baiana e de milhares de adoradores da iguaria espalhados pelo mundo.
                                   Segundo o antropólogo Vivaldo da Costa, o quitute genuinamente africano e baiano por graça tem presença em terras brasileiras marcada há mais de duzentos anos, quando além de vendido a pregão nas ruas da Bahia era ofertado ao orixá Iansã ou Oiá, no culto sagrado do Candomblé.
                                    Para outros pesquisadores, "O acarajé dos Iorubás da África ocidental (Togo, Benim, Nigéria, Camarões) que deu origem ao brasileiro é por sua vez semelhante ao Falafel árabe inventado no Oriente Médio. Os árabes levaram essa iguaria para a África nas diversas incursões durante os séculos VII a XIX. As Favas secas e Grão de bico do Falafel foram alternados pelo feijão-fradinho na África".
                        Etimologicamente, acarajé vem de 'akará', que na África significa 'bola de fogo' e, no Brasil, foi adicionado a terminação 'jé', cujo significado é 'comer'. Literalmente, acarajé significa 'comer bola de fogo'.
                                    No princípio, o pequeno bolinho feito de maneira simples servia para agradecer pedidos mas, com o final da escravatura, deu um verdadeiro salto rumo às ruas baianas para, através da sua comercialização, garantir o espaço social de famílias, e principalmente, mulheres afro-descendentes.
                                                                           Acarajé
                                    De lá para cá, o bolinho de feijão fradinho moído, frito no azeite de dendê, se tornou o maior representante da culinária baiana, é comentado em diferentes partes do globo e entoado por diferentes vozes. E já afirmava o poeta e compositor Dorival Caymmi, em A Preta do Acarajé:
“… Todo mundo gosta de acarajé, o trabalho que dá pra fazer é que é…”
                                     Mas como diria o sociólogo Roque Pinto**, já não é tão complicado assim. Na atualidade, as “baianas de acarajé” não precisam vagar à noite em busca de compradores de seus quitutes com tabuleiros erguidos a cabeça – como era de costume. É real dizer que ao invés de irem até os clientes, as baianas de acarajé possuem hoje uma verdadeira legião de fãs, que as procuram em pontos fixos de todo o Recôncavo Baiano.
                                     Sem entoar cânticos, as contemporâneas baianas de acarajé ganharam tabuleiros padronizados, enormes tendas, enormes filas e altos preços para valorizar a iguaria que ofertam.
“Vem benzê-ê-em, tá quentinho. Ô acarajé ecó olalai ó”
Chef Cacarajé com sua equipe

                                     Depois de divulgado, popularizado e difundido, o acarajé caminha para a profissionalização. Mas como profissionalizar um quitute? Simples. Com a criação de uma Associação de Baiana de Acarajé, apoio governamental e um selo de qualidade (isso mesmo, quase um Inmetro do dendê), baianas de acarajé conseguem consolidar uma verdadeira estrutura de produção dos bolinhos, ou seja, nada de ralar o feijão em pedra e amassar na mão, como nos seus primórdios de criação.
                                     Incrível, não? Nada devagar, o hambúrguer de baiano ganhou as cadeias de Fast Food, ou comida rápida, e cursos já são oferecidos para quem quiser comercializá-lo, com matérias como atendimento ao cliente, manipulação de alimentos e finanças.
                                     Hoje, quem estiver interessado em apenas saborear não precisa mais esperar uma baiana passar entoando cantigas ou mesmo se dirigir a uma das inúmeras tendas espalhadas pela cidade. Ao entrar em um mercado, é possível comprar a mistura pronta, que ao adicionar água e ser despejada em forma de bolinho em uma fritadeira com dendê, se transforma - como que em um passe de mágica não tão especial – no acarajé.
 
Texto enviado por Cacarajé com grifos de Epitácio Andrade.
 
ENDEREÇO: CACARAJÉ Avenida Praia de Muriú, 8833 (conjunto ponta negra) segue na avenida Praia de Genipabu, que é a rua que fica entre o praia shopping e o pitts burg,vai ate o final da rua a 7° casa a esquerda,em frente ao colégio machadão!